Nunca bebi tanto sangue romeno quanto nesse primeiro inverno no Bicazului. De nascimento sou meio székely e meio romena. Possuo um pouco de sangue russo, por conta de vovó Vladia, mãe de minha mãe, de quem minha irmã herdou o nome. Mas de tanto beber sangue romeno, talvez minha porção romena tenha aumentado consideravelmente. Porém, sabia que meu banquete não demoraria muito. Logo chegaria a época dos contrabandistas tomarem o caminho de volta, rumo ao leste. Eu sabia que, quando retornassem, viriam bem armados e preparados contra mim. Por conta disso, antecipei minha retirada. Sai de minha gruta, próxima à trilha e me embrenhei de novo na floresta. Voltei a me alimentar de animais, para não despertar suspeitas. Não tardou para a primavera chegar. Quando o gelo começou a derreter e gotejar das pontas dos galhos, eu já me encontrava próxima ao lago Santa Ana.
Foi neste período que reencontrei um velho conhecido. Fui surpreendida, um fim de tarde, pela melodia suave de uma flauta doce. A música me era familiar, embora não conseguisse lembrar porque. Fui em direção a ela e me deparei com o vampiro magro que vira em minha infância. Lá estava ele, sentado sobre um tronco derrubado de pinheiro, com suas roupas rotas de bardo, tocando sua flauta despreocupadamente. Aproximei-me sem medo e sentei a seu lado, pois o tronco era grande. Ele simplesmente continuou tocando, até terminar. Então baixou a flauta e ficou parado, com o rosto encoberto pelos cabelos longos.
_Foi lindo! _elogiei.
_Não falo magiar! _respondeu ele em romeno.
_Perdão!... _desculpei-me em romeno.
_Como aprendeu romeno? _perguntou.
_Minha mãe era romena. _respondi.
Ele então voltou o seu rosto pálido para mim, trazendo-me de volta antigas lembranças de infância. Sorriu, demonstrando jovialidade, apesar de sua compleição castigada. Aparentava ter menos de trinta anos. Disse então:
_Eu lembro de você. Você era a menininha que vi correndo na neve, acho que há uns dez anos.
Ri levemente como resposta, baixando a cabeça, envergonhada.
_Você ficou linda!... _elogiou, tocando meu rosto. _Mas quem fez isso com você?... _inquiriu.
Balancei a cabeça negativamente, dei de ombros e respondi:
_Não as conheço.
_Foram as meretrizes, eu as conheço bem. _respondeu em um tom de desprezo.
_Então elas não são estranhas aqui!...
_Não, são bem velhas. Talvez as mais antigas daqui.
Ele então tomou da flauta novamente e começou nova melodia. O ouvi calada, por um tempo, mas logo a curiosidade instigou-me a perguntar:
_Foram elas que lhe amaldiçoaram?
_Não, quem me amaldiçoou já morreu, na mão dos ciganos.
_Quem foi?
_Uma nobre perdida, como você.
Fiquei ofendida com o que ele disse e rebati:
_Não sou perdida!
_Estamos todos perdidos, Irina! _respondeu.
_Como sabe meu nome?
_Foi assim que sua babá lhe chamou.
_Ainda lembra disso?
_Sim.
Calei-me novamente. Ele voltou a tocar. Poucos minutos depois, perguntei:
_Qual é o seu nome?
_Dimitru.